Domingo era dia de macarrão com frango assado. E me parece que nem faz tanto tempo que esse era o cardápio especial de fim de semana nas mesas das famílias, pelo menos da região sudeste do Brasil. Claro, estamos falando de classes mais da base da pirâmide. Eu não faço ideia do que a classe 'A' consumia.
Nas residências mais abastadas, onde a ‘bufunfa’ era mais farta, o macarrão poderia ser de massa fresca com um molho de tomates natural preparado, muitas vezes de véspera, pela ‘secretária do lar’ e o assado de frango era composto apenas pelas partes mais nobres como coxa e sobre-coxa.
Em casas mais humildes, a penosa inteira, assada no forno de tampa bojudinha do fogão Semler, fazia a alegria da criançada na disputa da asinha mais gorda, enquanto as coxas suculentas e o peito da ave eram destinados aos pais e avós.
E ninguém pensava nesse negócio de não comer a pele do frango. Ela sobrava apenas se não estivesse crocante o suficiente.
A travessa de vidro Marinex, que podia ir ao forno, era a estrela no centro da mesa, ostentando o macarrão grosso com furinho no meio, à moda de um tubo, temperado com extrato de tomate comprado em copos de vidro. Copos que depois viravam ‘cristal cica’, em um deboche divertido com o reaproveitamento do recipiente para servir café ou suco.
Após o almoço, independente de classe social, as crianças se juntavam aos primos e vizinhos para brincadeiras na rua ou nos quintais espaçosos refrescados por árvores e hortas.
As tardes de domingo não eram propriedade dos shopping centers, dos jogos de videogame ou da netflix. As tardes de domingo eram domínio da arte do convívio.
Convívio do qual sentimos tanta falta hoje.
Hoje em dia o frango assado vem da ‘televisão de cachorro’ instalada na frente dos açougues e padarias. As massas variadas são vendidas em bandejinhas de papel e ficam prontas em poucos minutos, mas não se pode esquecer de tirar o filme plástico de cima antes de levá-las ao microondas.
E você pode até insistir em acreditar na propaganda, mas todas elas têm o mesmo sabor. Aquele gostinho de comida da mamãe, sem conservantes e com amor, ninguém consegue reproduzir.
A travessa Marinex ainda pode ser usada para requentar as sobras das massas e frango. A Cica não resistiu à globalização e foi absorvida pela Unilever e as pessoas - mesmo antes da pandemia que as trancou em casa - estão sempre diante de alguma tela de cristal líquido na busca infrutífera de preencher um vazio que não conseguem definir muito bem.
Eu tenho cá pra mim que esse vazio pode ser falta de macarrão com frango.
Maria D´Arc Hoyer é jornalista
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