Como driblamos a carência de abraço e afeto na quarentena


O tal isolamento social, tão necessário para conter o avanço do coronavírus, afeta os brasileiros em uma área muito sensível: o hábito, quase uma necessidade, de distribuir e receber abraços.

Somos um povo caloroso, que expressa afetividade por meio de toques e beijos. E, de repente, fomos privados de tudo isso.

E mesmo sendo o abraço um recurso aprovado em pesquisas como fortalecedor do sistema imunológico, nesse momento, o risco que ele traz é maior que o benefício.

Como manter a distância social passou a ser um sinal de respeito pela vida e a saúde do próximo, o jeito é descobrir novas formas de mostrar ao outro que você se importa com ele. E, claro, receber afeto em troca. 

Ainda em fevereiro, um vídeo viralizou escancarando essa necessidade tão humana. Um garotinha chinesa impedida de abraçar a mãe, enfermeira que trabalhava na linha de frente do combate à Covid-19 em um hospital de Wuhan, abre os braços no ar, vendo a mãe a distância. É desolador. (confira link no final do post).

No Brasil, ganhou destaque a criatividade de um médico, do litoral norte de São Paulo, que se vestiu de dinossauro para poder abraçar o filho. Foi uma aposta arriscada, mas passado o susto inicial do pequenino, tudo correu bem. Você pode conferir o momento aqui nesse link: https://www.facebook.com/100012674196953/videos/911093085989823/

O isolamento se estende e as pessoas vão ficando inquietas e até quem não é da área da saúde e não se veste de dinossauro dá seu jeito para confraternizar com seus queridos. 

Carreata e buzinaço para celebrar a chegada da Eloá

Tudo certo e planejado para o chá de bebê da Eloá. Lembrancinhas prontas, data marcada, amigos e parentes convidados, até que... a quarentena foi decretada. 

O que fazer? Deixar passar em branco uma data tão especial ou usar a criatividade para não desistir de celebrar?

Luana de Souza Veloso não se rendeu às limitações impostas pela quarentena e descobriu na internet que uma carreata poderia ser a saída.

Com a ajuda da mãe e do 'namorido' Thiago Ibiapina, ela explicou aos convidados que eles deveriam passar em frente a sua casa, de carro, máscaras, deixar o presente e pegar a lembrancinha.




Ela só não esperava que os convidados fossem incrementar a carreata da alegria, ou "charreata", como ela batizou o evento. Os carros foram enfeitados com balões coloridos e o buzinaço promovido por eles, levou muitos vizinhos ao portão.

Arq. Pessoal - Thiago e Luana com presentes
 Graças a Deus minha família é maravilhosa, unida, sempre entram no clima e sempre tem alguma surpresa no meio rs. Também vieram alguns amigos que convidei. Mesmo não podendo reunir, abraçar, só de sentir o carinho de todos eu fiquei muito feliz e emocionada.

A festa foi rápida. Só o suficiente para deixar os presentes e receber as lembrancinhas do chá de bebê. Sem abraços nem os tradicionais afagos na barriga da mãe de Eloá. Porque todo mundo quer ver se o bebê está chutando. 

200 quilômetros de estrada só para ouvir: “Oi vovó”

19 de abril é um dia especial para Aparecida Eclair Covo Bueno Rodrigues, ou simplesmente a Cuca, como é conhecida entre amigos e família. É o aniversário do Benício, um dos xodós da vovó Cuca. 

“Não foi fácil decidir o que fazer para comemorar com ele. Afinal, nós já estávamos há um mês isolados em casa e sabemos que todos os riscos devem ser evitados.”

Ela lembra que precisou disfarçar até o último momento, quando já estava a caminho e recebeu ligação que a convidava para a festa virtual do neto.

Chegando lá, ganhou a recompensa suprema de qualquer avó: “Vovó, você veio!”. Sim, ela foi, mas só até a área externa do prédio. E, embora tenha faltado o abraço propriamente dito, os dois reafirmaram o amor que sentem um pelo o outro, olhos nos olhos.


Arq. Pessoal: Benício e Vovó Cuca ofertando amor e boas energias um ao outro

Cuca faz questão de dizer que resistiu bravamente e em momento algum tocou nos netos. Mas acredita que valeu a pena o esforço para vê-los e reforçar os laços.

Depois foram mais 200 quilômetros de volta pra casa com o coração cheio de alegria. E como a quarentena está prolongando ela já começa a pesquisar ideias para produzir uma fantasia que possa permitir chegar mais perto dos netos, com segurança, pois, em Julho, tem o aniversário do Fabrício. 


Prejuízos emocionais do isolamento social

Embora concorde que esses gestos das pessoas em busca de contato são paliativos importantes, José Edson Pereira da Silva, Terapeuta especialista na Medicina Bioenergética - B.E.M, reforça que nada substitui o que é inato. “Nossa natureza não se desenvolveu assim. Os vínculos são importantes a todo instante, e mantê-los neste momento ainda mais.”
“Antropologicamente falando somos seres cinestésicos, onde o contato físico é primordial, assim o distanciamento pode acarretar sérios distúrbios psicoemocionais em muitos de nós.”


José Edson - Foto: Arq. Pessoal
O terapeuta explica que somos seres de alta percepção sensorial e estar em isolamento é ficar privado de percepções como o contato físico e o olfato, por exemplo. “São percepções que nos formataram ao longo do desenvolvimento de nossa espécie. Há ainda as camadas eletromagnéticas, que envolvem o nosso corpo físico, chamada de bioenergética, onde temos trocas vibracionais com os demais seres vivos, capturando e emitindo sensações diversas, muito decodificadas em forma de emoções.”

José Edson diz que os paliativos ajudam, mas nada substitui o abraço. “Podemos dizer que uma ligação por câmera ajuda, que sentar a porta de alguém ajuda, que mandar uma carta ajuda, que um aceno de tchau ajuda, mas nada substitui o calor de um amoroso abraço, em que os nossos corações se "tocam", e o genuíno perfume que exala, percebidos pelos sensíveis sensores olfativos, que se registram em nossa memória. Isto nos faz seres humanos!”

A Eloá, filha da Luana, é esperada para o comecinho de julho. E a gente fica na torcida para que ela possa crescer em um mundo no qual o abraço já não seja mais motivo de medo. Ela, como tantos bebês, que estão chegando nesse período complicado são pequenos raios de esperança que renovam nossa fé na vida. Vai passar!


Maria D´arc Hoyer é jornalista, teimosa demais e, talvez por isso, insista em acreditar no lado bom da vida.

Links para conferir:
Photo by Artem Beliaikin on Unsplash
Abraço no ar em Wuhan
https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2020/02/05/interna_internacional,1119660/separadas-pelo-coronavirus-mae-e-filha-dao-abraco-no-ar-veja-video.shtml

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