Perdidos no espaço

Crônica aborda o absurdo do isolamento humano que coloca em cheque o sentido da vida

Pode ser filme ou livro, qualquer coisa que nos sirva. Mas talvez vocês pensem como eu: o isolamento nos deixou encalacrados, paralisados num mesmo momento, onde o ontem, hoje e o amanhã se repetem da mesma forma com mínimas diferenças.

Como Sísifo, condenado pelos deuses a empurrar para o cume da montanha , eternamente, uma enorme rocha que, ao chegar ao topo, rola novamente ao solo. O filósofo Albert Camus aborda de forma brilhante o tema em O Mito de Sísifo, um ensaio sobre o absurdo.

Realmente vivemos um absurdo, como nos lembra o brilhante poeta bêbado, Charles Bukowski. Seu poema Sem Chance de Ajuda trata de “um lugar em nossos corações que não pode ser preenchido”, mesmo nos melhores momentos ou satisfações pessoais.

É como a pedra de Sísifo que nunca permanece no ponto mais alto da realização humana. Insatisfeitos entre quatro paredes ou mascarando o medo ao outro pelas ruas, agora esse espaço vazio no peito nos surge maior; e não temos como preenchê-lo, por não ser ele físico e sim existencial.

Tristeza social cultivada

Gravura do artista holandês Maurits Escher

É preciso aprender a só ser, canta um poeta, mas, pandemia e isolamento nos encurralaram, sem pódio de chegada ou beijo de namorada, reféns de uma tristeza social cultivada, escrava submissa de uma busca material insaciável.

A força da cobiça a esmagar coisas belas. Empresto aqui, como exemplos - entre diversos - o filme espanhol A Trincheira Infinita (2019) e outro mais antigo não menos famoso, Cidade de Deus (2002), nos quais mortes e aprisionamentos, injustiças e desigualdades, gerados por um sistema desumano são consideradas efeitos colaterais e não dilemas morais e sociais.

São séculos de sacrifício profano, queimando milhares de corpos ou transformando em cinzas nossos sentimentos. Estamos perdidos no espaço, não importa se em casa, não importa se no mundo. Algum livro, algum filme, alguma coisa que nos dê sentido?

Luiz Carlos Teixeira é jornalista apaixonado por literatura, descomposturas, companheiros de quatro patas caninos e felinos e acredita que navegar é preciso, mas viver não exige tanta precisão assim...

Foto do espaço:  Photo by NASA on Unsplash

Postar um comentário

0 Comentários