Acordei esquisita hoje. Uma sensação de ressaca, mesmo tendo bebido apenas chá na noite passada. Mas a cabeça pesa, uma sensação de que algo está faltando me corrói o estômago. Um grito não dado talvez? Pode ser. A angústia contida de tantos dias tenebrosos que vivemos sozinhos e em conjunto, decerto, é o que causa isso.
Passei um café e depois passei algum tempo procurando os motivos da estranheza das minhas entranhas, do desassossego da alma. Mas minha procura se deu entre pensamentos descoordenados, uma caldeirada de notícias tristes de vozes que se calam, de canalhices políticas, de rotina e afazeres domésticos de um dia de sábado.
São tantos fatos e situações absurdas, do meu ponto de vista, que me fazem imaginar ser essa a sensação de um peixe fora d’água. Sem chegar a lugar algum e vendo o monstro sorrir dentro de mim, me sentei para escrever e praticar minha purgação, a única forma de entrega real que conheço e que, de algum jeito, me organiza.
Escrevendo, fui elaborando que há tanta falta no mundo, que, nesse momento, ela faz parte de mim. Sou toda eu uma falta, refletindo esse vazio que a vida vem se tornando, ou no qual vamos tornando o mundo.
Sem olhar pra dentro, seguimos, em multidões, mesmo quando trancados em nossos quartos; zumbis conectados que já são máquinas, ou extensões delas. Não temos mais as conexões físicas. com a frequência que seria necessária para nos fazer sentir vivos e parte de algo maior que a gente.
Em busca de termos muito, caminhamos para o nada absoluto. E, agora, nessa falta de tudo, nos perdemos dentro das pequenas telas em nossas mãos, transformadas em espelhos, refletindo apenas o melhor de nós, a roupa mais bonita, o passeio mais incrível. Um feed que só muda quando tragédias sacodem a perfeição e esfregam na nossa cara a fragilidade preciosa da vida.
Numa fuga permanente, somos cada vez mais passageiros de uma era fluída demais para deixar marcas que valham à pena. É possível que tudo isso e mais um monte de coisas que não consegui traduzir em palavras - ainda - sejam a causa da angústia, do desassossego, da inquietude dessa alma velha, que, mesmo caduca, fica à procura de um sentido para tudo que a cerca. Haverá?
Maria D´Arc é jornalista
0 Comentários